Sobre perder um bebê

Eu e o Paul já estávamos juntos há bastante tempo e ter um filho era uma realidade distante, apesar do meu desejo. Eu pari uma empresa, um restaurante e uma hérnia de disco antes de conseguir realizar a gravidez. O chamado da maternidade veio com a percepção de que o tempo estava passando e rápido, esse desejo era só meu, mas com uma boa dose de convencimento, passou a ser nosso.

Quando a gravidez veio não foi surpresa, planejei cada momento, controlei dias férteis e enlouqueci a cada menstruação que chegava. Briguei com o marido pela falta de comprometimento com os dias bons e, depois de três longos meses, estava lá os dois traços no exame de farmácia que fiz.

Era uma sexta feira do final de abril e no dia seguinte nós dois estávamos a caminho de Las Vegas para um congresso. Meu médico foi quem soube da notícia primeiro, pois eu precisava decidir se viajaria ou não. Com a carta branca, contei para a minha irmã e o Paul contou para o pai dele, e mantivemos o segredo, pois não fazia sentido contar e estar a 16 horas de avião de distância. Enjoei com cheiros doces, impliquei com o perfume do marido e com abóbora e sálvia. Sentia muito sono e mais um monte de sintomas típicos de uma gravidez. Eu estava feliz com cada um deles.

Planejei meu retorno ao Brasil, como contar aos familiares e amigos, escolhi uma data, o dia das mães – quanto mais tempo passasse mais “certa” seria a gravidez. Compramos diversos brindes e lembrancinhas para fazer o grande anúncio. Valia a espera.

Corta para o dia das mães, almoço em família e, na hora da sobremesa, a nossa doce revelação. Um bebê estava a caminho. Lágrimas por todos os lados, abraços e afagos na minha barriga, no meu bebê.

Dois dias depois fomos fazer nosso primeiro ultrassom e em meio aos ruídos e ao preto e branco da tela, estava lá o nosso bebê perfeito, não fosse pela ausência das batidas do seu coração… Quis gritar, correr, sumir. Quis chorar, sentar no chão e dormir. “Uma luz se apagou nas últimas 24 horas”, disse o médico, “sinto muito, é a natureza”. Saí de lá direto para o meu ginecologista, que abriu o seu consultório para nos receber. Foi o pior dia das nossas vidas. Um mundo de questões passou pela minha cabeça, pensei que não deveria ter feito a viagem, achei que exagerei no trabalho, procurava uma razão e não encontrava nada a não ser o conforto dos braços do meu marido. Queria repetir o exame mais um milhão de vezes se possível, mas isso não mudaria em nada o curso dos acontecimento.

Nessa hora a gente descobre que perder um bebê no primeiro trimestre é muito mais comum do que a gente imagina, e ouve até de amigos bem próximos relatos emocionantes de perdas tão doloridas quanto a minha. Meu médico foi mais do que um médico, um verdadeiro amigo em ter me acolhido, de ter gasto horas me convencendo que não era minha culpa e também de tomar todas as providências para uma rápida curetagem – quanto mais rápido meu corpo assimilasse que não havia mais um bebê crescendo dentro de mim, mais rápido minha mente também se recuperaria. A gente nunca se recupera. Às vezes ainda me pego imaginando como ele(a) seria agora, que nome teria e com quem seria parecido, mas a vida segue e nos deu a oportunidade de ser pais novamente e agora é pra valer.

 

Crédito de imagem:  kouk

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2 Comentários

  1. 3 de julho de 2013 at 11:12 — Responder

    Patrícia,
    Revivi lembranças com esse post. Após quase 5 anos de tentativas da 2ª gravidez, perdi também minha sementinha. O vazio no coração só não foi maior por que eu tenho o Arthur para amar. Mas 2 meses depois recebi a melhor notícia dos últimos tempos e hoje estou com minha Maria Eduarda no colo.
    Não tive coragem ainda de escrever sobre isso, mas lendo seu post me acendeu uma chamazinha de querer compartilhar com as mamães.
    Beijinhos
    Aline Gago
    http://festascriativasbyalinegago.blogspot.com
    http://bibliotecamirim.blogspot.com

  2. Patricia
    3 de junho de 2015 at 15:38 — Responder

    Olá
    Seu texto me fez reviver o dia que o ultrassom falava que minha bebe não tinha mais batimento cardíaco ( 38 semanas de gestacao )
    Ainda terei coragem de escrever, 2 anos para mim é muito recente 😳

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