Nunca consegui lidar bem com essa história de criança pequena dizer que está namorando. Assim como deixar criança assistir a vídeo de cantora sensualizando na TV, estimular essa coisa do “namoradinho (a)” ainda no maternal é das coisas mais inapropriadas que eu já vi.
Nunca pensei muito no quanto a Victoria (não) presencia o amor romântico. Nos separamos quando ela ainda tinha dois anos e desde então nunca apresentamos namorados (as) pra ela. Até que, quando ela tinha uns quatro anos, e parte da turma começou com a história de namorar. Cada vez que nos encontrávamos era uma “fofocada” de quem estava namorando quem. E eu comecei e ver a Vicky meio quieta nessas conversas. Ela ria dos amigos que soltavam o verbo, mas se mantinha quieta. No afã de todo mundo dedurando os amigos, o nome dela não apareceu nenhuma vez. E, num desses dias de pizza pós-escola, quando eu olhei pra ela de longe, ela me olhou de volta e fechou a cara. Resolvi não falar nada. Quando ela fecha a cara, já sei que ela não quer falar no assunto.
Foi quando eu comecei a pensar. Os avós são separados, os pais separados. O único casal que ela vê com mais frequência são os tios. Será que era isso que fez com ela ficasse arredia em relação ao assunto? Por que Victoria não é exatamente uma criança introvertida ou tímida.
Prestando atenção na minha filha
Nos meses subsequentes eu comecei a “sondar” essa história, bem de leve. Ainda naquele ano de 2014 eu comecei a expressar o meu desejo de quem sabe arrumar um namorado, pra poder entender a reação dela. Ela entrou em pânico e disse que eu já tinha namorado e era o papai. Ui! Alerta de problema. Em 2015 ela foi pra psicóloga. Depois de dois anos, acho que ela estava começando a entender a separação e isso deu uma pirada dela, ela se sentia dividida e tal.
Perto do dia dos namorados daquele ano, voltei com o assunto. Eu queria que ela entendesse que a mamãe não namorava mais o papai e que em algum momento eu ia querer um namorado. Comecei brincando, dizendo que ia arrumar vários namorados. Ela ficou chocada. Depois disse que ela queria ser a minha namorada. Eu ia explicando com muita clareza todos os obstáculos que ela ia colocando. No fim, quando eu disse que ia ser muito legal achar um namorado que fosse com a gente no cinema e levasse a gente pra tomar sorvete de casquinha duplo, ela topou. Eu ri.
Dia dos namorados
Nesse ano de 2016, bem no dia dos namorados, eu e ela estávamos em casa. Eu via um filme no sofá da sala e ela estava brincando no quarto dela. Na escola eles tinham feito o correio do amor na escola, onde eles podiam mandar mensagens pros amigos, professoras e funcionários. Em dado momento ela chega abruptamente ao meu lado.
– Mãe! Hoje é dia dos namorados! (não era uma pergunta)
– É sim filha.
– Por que a gente está em casa? (meio com raiva)
– Bom, hoje os restaurantes estão meio cheios, achei que era bom a gente ficar em casa, ver um filme e tal.
– Mãe, cadê o namorado que você prometeu? (cara fechada)
– Então filha, mamãe tá meio sem tempo, não tá quase saindo…
– Mãe, assim não dá, eu quero tomar sorvete! (sai batendo pé)
Lá fui eu atrás dela.
– Mas por que você não arrumou um namorado?
– Mãe! Criança não namora!
– Não? Mas e seus amigos?
– Mãe, eles estão pirados. Eu já expliquei. Criança não namora. Pra namorar precisa tomar uma vacina (!!!) e essa vacina só dá pra tomar quando é adolescente. Eu hein? Eu que não quero beijar ninguém sem vacina. Você já tomou essa vacina, mãe?
– Oi?
– Ai, mãe, você não entende nada de namorar. (saí de lá, fui comer pipoca e voltar pro meu filme)
Uns dias depois eu entendi que eu não tava fazendo nada de errado e que, no fundo, ela estava entendendo tudo. Criança não namora. Criança tem amigo, brinca, faz bagunça. Palavras dela.
Minha filha sabe tudo.
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Camila a vacina em questão, seria a do HPV?