Mundo Ovo

Por que temos dificuldade em dividir nossos filhos?


Semana passada assisti (finalmente) ao filme “O maior amor do mundo” [Mother’s Day], com a Jennifer Aniston e mais um monte de atores e atrizes estelares. O filme mostra três gerações de pais e mães, vivendo diferentes momentos, há uma semana do Dia das Mães.

A Jennifer Aniston, mãe quarentona de dois meninos, precisa lidar com o fato de que o ex-marido acaba de casar com uma menina muito mais jovem do que ele. E ela. E como se isso já não fosse difícil o suficiente, o pai sem noção já começa a querer colocar a moça goela abaixo dos filhos, inclusive insistindo que, no Dia das Mães, as crianças passem parte do tempo na casa dele. Claro que tudo tem um tempero exagerado hollywoodiano e o filme é divertidíssimo, mas uma coisa ficou na minha cabeça:

Por que temos dificuldade de dividir as crianças até mesmo (ou principalmente) com os pais dos nossos filhos?

Victoria tinha apenas dois anos quando nos separamos. Ele sempre foi muito presente, mas como ela ainda era um bebê, era difícil pra mim deixar ela passar a noite fora. E era difícil pra ela passar a noite longe de mim. Ele achava que era assim mesmo e acho até que ele, durante um tempo, não se sentia confortável em lidar com essa situação.

O tempo foi passando e a Vicky foi crescendo. A primeira noite que ela passou na casa dele eu fui ao supermercado. Pois é. Eu deveria ter aproveitado aquela noite, me arrumado e ido paquerar em algum bar com as amigas. Mas, não. E entre pegar dois pacotes de arroz e procurar onde tinha se escondido a prateleira de chocolates eu chorei. E não foi aquele lacrimejar discreto, não. Foi aquele choro sentido de quem não estava preparada para viver aquele momento. De dividir a filha com pessoas que não fossem ela. De perceber que ela viveria momentos especiais e você não estaria presente. Resumindo, gente. Foi uma grandessíssima m&*%$da.

No filme acontece a mesma coisa. Ela percebe as crianças gostando de passar mais tempo com o pai; percebe o pai agindo com a nova esposa do jeito que ela queria que tivesse sido com ela, percebe as crianças gostando de passar tempo com a nova moça.

Minha filha ama o pai dela na mesma intensidade que me ama

Por aqui, jamais duvidei da minha importância no coração da minha pequenina, mas isso em nada diminuiu o meu desconforto. Claro que, eventualmente, aproveitei para curtir os momentos que eu passei a ficar sozinha para “voltar a ser adulta”. Academia sem hora pra voltar, sair, paquerar, prestigiar os lançamentos de livros dos amigos e, porque não?, ficar em casa de pernas pro ar, uma taça de vinho na mão e o controle da TV na outra.

Mas celebrei em silêncio toda vez que ela quis voltar pra casa antes do final de semana acabar, ou as madrugadas que ele me telefonava por que ela estava com febre ou dor de ouvido e queria ficar no colo da mãe dela. Eu também me sentia mesquinha. Mas eu ficava feliz. Fingia que era uma grande inconveniência. Mentira, acho que eu nem disfarçava direito que o lugar dela era ali, aninhada no meu peito.

Mas por que criança cresce e a gente cospe para cima só pra cair bem na nossa testa, ultimamente precisei lidar com o fato de que ela também ama o pai dela na mesma intensidade que me ama. Alguns domingos ela passou a me ligar de manhã por que queria saber se poderia ficar mais um dia na casa dele. Eu sempre digo sim e passei a mandar mais uniformes para essa eventualidade, até por que eu sou essa pessoa evoluída, claro. Mas meu coração parou por um segundo quando recebi esse telefonema pela primeira vez, confesso.

Reconheço a importância do pai na vida dela e mais do que isso, abraço totalmente a ideia de que ele é igualmente fundamental na criação dela.

Meu nariz também franziu quando ela começou a comparar os momentos divertidos que vive com o pai nos finais de semana aos momentos chatos que ela passava comigo na terça-feira à noite quando eu não deixava ela tomar picolé. Esse golpe foi abaixo da linha da cintura e eu precisei sentar e conversar bem sério sobre nossos papeis na vida dela.

Claro que eu fiquei com a maior parte da trabalheira, consequentemente com a maior parte dela, inclusive tudo de lindo que ela traz pra mim a vida toda. Mas ele tá lá, um segundo lugar bastante respeitável, e eu faço questão de deixar o caminho livre e desimpedido para que eles se relacionem e raramente me meto a ser sabichona e dizer como ele deve agir com ela. Tem horas que meus dentes trincam e ele nunca se aborreceu abertamente com meus “conselhos”. Mas eu honestamente me coloco no meu devido lugar e observo de longe. Acho que tá funcionando bem essa dinâmica.

Percebo agora que esse post não tem fim. Não tem uma lição de moral, não tem uma dica de ouro, nem uma regra de sobrevivência, além de dizer pra você que ser mãe é precisar colocar um escudo em torno do coração de vez em quando. Por que é tão difícil compartilhar nossos filhos. Seja com o ex-marido, com a escola, com os eventuais outros cuidadores.

Nossos filhos vão, desde muito cedo, viver histórias que não são presenciadas e muito menos controladas por você. E isso é 100% benéfico, sempre. Menos pro seu coração de mãe. E eu, pelo menos, não tive vergonha de chorar no supermercado e admitir derrota diante do sentimento de impotência ao descobrir que eu não era onipresente.

E você?