Já virou lugar comum dizer que as crianças de hoje nascem com um controle remoto na mão. Ou um smartphone, ou um tablet, não importa. O fato é que, lugar comum ou não, isso é verdade. E não adianta argumentar que isso ocorre somente com as crianças privilegiadas que têm acesso a tudo isso. Basta fazer a experiência: entregue um tablet a um menino de 8 anos que nunca viu nada disso na frente, e em 10 minutos ele terá baixado mais aplicativos do que você em 1 mês. Cada vez mais penso que inclusão digital é uma questão de oportunidade, e não de formação, pelo menos no que se refere às crianças. Mas isso é assunto pra outra hora.
O entrosamento e o interesse pela tecnologia dos nascidos nas últimas duas décadas já tomaram tamanha proporção que, como um efeito borboleta, têm obrigado diversos setores da cultura e do consumo a se adaptarem a um público completamente diferente da geração X (1965-1979) ou dos Baby Boomers (1946-1964). Distantes do perfil contemplativo, as crianças e os jovens da atualidade prezam a conectividade, a interatividade e a participação como forma de reflexão. O resultado disso é que, instituições tradicionais como os museus vivem uma era de transformação e não sabem ainda o que virá pela frente. Só uma coisa é certa: não dá mais pra ser o mesmo, apresentar obras de arte da mesma forma, oferecer atividades educativas iguais às de 10 anos atrás, nem esperar uma turma silenciosa e tensa escorregar em pantufinhas por dentre grandes salões historicamente mobiliados. O papo agora é outro.
Então, se você, como eu, é mãe (ou pai) de um desses pequenos, o primeiro passo é reconhecer que a forma de seu(s) filho(s) se relacionar com a tecnologia é completamente diferente da sua. Eles são mais rápidos, mais ágeis e mais espertos do que nós. Ponto final.
Quer dizer, ponto final, não; vírgula. Porque, como fica essa nova geração diante de valores culturais como leitura, visitas a museus e a centros culturais? E qual o papel dos pais como intermediários e facilitadores desse diálogo entre criança e cultura? A leitura merece um post à parte; mas, quanto aos museus, pensei em uma série de comentários a respeito desse assunto. Não chegam a ser dicas, mas podem ajudar de alguma forma.
– É engraçado pensar que, em geral, pensamos em museus somente quando viajamos. Mas vá lá. Se você quiser levar seu pequeno a museus na Europa, vai perceber que cada país tem sua peculiaridade. Na França, a sociedade (e, consequentemente, os museus) tende a ser mais conservadora. Os grandes museus ainda têm um perfil de visitação tradicional, não reagem bem aos barulhinhos e à agitação das crianças, digamos, mais empolgadas. Por outro lado, os acervos costumam ser democráticos e há pra todos os gostos. As múmias do Louvre, por exemplo, são irresistíveis para qualquer criança a partir de 4 anos de idade.
– Fora isso, em Paris, há centros culturais específicos para o público infantil, como o Parc de la Villette, com a Cité des Sciences, a Cité des Enfants e o Géode (espécie de planetário). A programação é intensa, as atividades são separadas por faixas etárias, e dá perfeitamente pra passar o dia inteiro lá.
– Ainda em Paris, há o Palais de la Découverte, que oferece exposições permanentes e temporárias de interesse infantil, em geral interativas e relacionadas às ciências. A meninada adora! Fora isso, o Musée des Arts Décoratifs, ao lado do Louvre, eventualmente também apresenta exposições sobre temas infantis, como a dos brinquedos Lego, a do Playmobil, e a atual, sobre brinquedos Star Wars. As crianças e os pais se amarram. Mas atenção: não vá ao Musée de la Magie (Museu da Magia), é uma tremenda tourist trap.
– Antes de viajar, fique atenta à programação dos museus. Se for época de férias na Europa (julho e agosto), a chance de ter inúmeras ofertas de atividades para os pequenos é grande. Se você se vira no francês, entre no site da prefeitura , no qual há a programação cultural sempre atualizada da cidade.
– Curiosamente, os museus mais child friendly a que já fui são em Manchester, cidade fora do eixo dos tradicionais centros culturais europeus, e localizada aproximadamente a duas horas de Londres. Tanto o Manchester Art Gallery (arte) quanto o Manchester Museum (ciências) são espaços receptivos e convidam naturalmente a criança a interagir e a participar. Há também o Imperial War Museum, de tema nada infantil, mas com uma exposição tão bacana, tecnológica e interativa que é impossível as crianças não curtirem. E se seus filhos gostam de futebol, há ainda o museu do Manchester United, localizado dentro do estádio.
– Em Londres, o British Museum oferece aos pequenos as inúmeras múmias, mas é um museu mais tradicional. Pertinho dele, há Natural History Museum, sempre indicado. Já o Tate Modern, com acervo focado em arte moderna, oferece um espaço especialmente dedicado aos pequenos, no qual eles podem brincar, tocar e interagir.
– O V&A Museum oferece um kit montessoriano de brinquedos aos pais que visitam o museu com crianças de até 5 anos (bebês inclusive!). Os kits são separados em 4 faixas etárias, a partir de 6 meses de idade. Assim, os pequerruchos ficam entretidos enquanto os adultos e as crianças mais velhas se divertem nas exposições. Ah, e são gratuitos, basta solicitar na entrada e deixar um documento com foto.
– Aliás, a Inglaterra de forma geral tem se mostrado mais tolerante em relação às crianças em público, vide o movimento Kids in museums, que defende maior liberdade de ação e de comunicação nas visitas de crianças em museus.
E, para esse texto não ficar exaustivo: os museus brasileiros também têm procurado se adaptar a esse novo público, formado por crianças (inter)ativas e conectadas. Antes de visitar um museu, procure o setor educativo da instituição que, ao contrário do que se pensa, não costuma atender apenas grupos escolares. Veja quais atividades são oferecidas, com a vantagem que os museus estrangeiros não têm: falamos a mesma língua.