Filha, as coisas acabam

Como dizer: filha, as coisas acabam sem que isso vire um circo dos horrores? Como se livrar das coisas sem causar um trauma?

 

Victoria tem um problema com perdas. Ela sofreu algumas desde pequenina e, por mais que a gente se esforce, cada trauma ou tristeza acaba trazendo um ônus para a criança. A Vicky não consegue lidar bem com a falta, seja de pessoas ou coisas. E eu me vejo dizendo constantemente: Mas filha, as coisas acabam.

Minha mãe torce o nariz e diz que ela é “apegada”. Minha irmã acha que eu tenho que sair dando tudo sem pena. E embora eu concorde com elas, tem algo em mim que sente que eu preciso lidar com essa questão de maneira menos agressiva e que ela tem um fundo emocional importante.

“Isso é a minha história!”

Para vocês terem uma ideia: ela chora por que as roupas ficam pequenas, por que os sapatos não cabem mais. Tudo vira um drama: “mas isso é a minha história!” ou “mas essa roupa foi a minha vó quem me deu! Ela era minha favorita!” Só que tudo é favorito na cabeça dela.

Muitas das coisas de bebê, como fraldinha e cueiro viraram acessórios para suas bonecas. Ela queria fazer o troninho de brinquedo, o carrinho dela de carrinho para as bonecas. O pote de Nutella não pode acabar, a bala importada que ela ganhou de um amigo meu não pode acabar, não pode faltar nada na geladeira.

Os amigos que passam finais de semana não podem ir embora. Ela chora quando alguém não pode ficar mais. E o único namorado que eu apresentei pra ela eu me arrependi amargamente, pois até hoje ela fala nele e chora por que eu “amo as pessoas, mas não escolho elas” (obrigada pelo soco abaixo da linha da cintura, Vicky).

Toda vez que eu explico que existem crianças sem pais, que não têm nada e precisam de nossa ajuda, ela diz que é pra gente comprar tudo novo para essas crianças, pois elas não merecem as “coisas velhinhas” que ela têm.

E vocês se enganam se acham que eu vivo em shopping e comprando coisas novas. Sou tão agoniada com esse jeito dela se comportar em relação às coisas que eu me recuso a comprar supérfluos; brinquedo só rola no Natal, Dia das Crianças e aniversário; só aceito presente de Dia das Mães se for feito por ela. Muitas de suas roupas ela ganhou ou herdou das primas.

E quanto menos eu compro, mais ela quer. E quanto mais ela tem, menos ela quer doar.

Mas, ao mesmo tempo, ela é aquela criança que divide os brinquedos com os amigos; que empresta seu boneco Luís (o favorito) para passar a noite na casa das amigas; que oferece um pedaço do seu chocolate ou de qualquer delícia que ela esteja comendo.

De verdade, em dias extremos eu me preocupo se ela vai virar uma acumuladora quando adulta, por que outro dia ela não queria se desfazer de gibis velhos pois poderia reciclar.

E, nesses dias, quando eu disse que a gente precisava experimentar todos os sapatos (pois ela perdeu TODOS) e os vestidos (o armário tava cheio e metade já não servia mais), rolou vários chororôs e eu precisei sentar com ela e explicar que as coisas tinham fim.

Mas, como explicar pra sua filha de seis anos, que casamentos e namoros acabam, que roupas ficam pequenas, que ela precisa ter menos brinquedos e que a gente até pode ter uma caixinha de coisas que podem ser recicladas e transformadas em arte, mas que não pode também sair acumulando lixo?

Estou em um dilema, gente! E preocupada em não estar sendo uma boa mãe, de estar ensinando errado, de estar tentando fazer a coisa de uma forma light, quando eu deveria pegar tudo e sair doando, vendendo, me desfazendo, na ausência dela e tornar a vida dela mais leve, na marra.

Alguém com uma dica de ouro? Alguém que pode me dizer como deveria agir? Pois me sinto muito impotente nesse momento.

 

Imagem: shutterstock

 

 

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4 Comentários

  1. Lori
    2 de junho de 2017 at 15:13 — Responder

    A impressão q tenho é de q vc não tá errada em tentar conversar em vez de agir na marra. Especialistas dizem que atitudes excessivamente drásticas não são boas para acumuladores. Sair dando as coisas dela pioraria o sentimento de perda dela. Aí sim estaria mais propensa a virar uma adulta acumuladora. Ela precisa entender que não se desfazer das coisas deixaria vocês sem casa em algum momento, de tão abarrotada q ela ficaria. E pessoas passam necessidade. Comprar coisas novas para os necessitados não é uma opção. Primeiro pq seu dinheiro não seria suficiente para bancar sua família e ainda comprar itens novos para os necessitados. E segundopq é errado, é pecado, desperdício mantwer as coisas sem uso enquanto outros precisam. Usar um carrinho de bebê para bonecas em vez de doar a um bebê carente é igualmente errado. Já pensou em levar ela a um asilo, orfanato ou escola carente?

    • Camila
      7 de junho de 2017 at 22:21 — Responder

      Oi Lori, concordo contigo em tudo e sim, já fomos a um orfanato. Nao falta empatia, eu acho, mas uma falta de noção quanto a desperdicio, valor do dinheiro, etc. outras maes me relataram o mesmo comportamento, em idades similares. Continuo por aqui tentando tomar as redeas da situação. Beijos

  2. Marina
    16 de novembro de 2017 at 21:15 — Responder

    Já ouviu falar em constelação familiar? Foi oq ajudou a resolver algumas coisinhas ak em casa. Recomendo.
    Vai conseguir entender porque ela se sente assim, e curar vcs😘

    • Camila
      21 de novembro de 2017 at 11:37 — Responder

      Marina, já sim e obrigada pela dica. Sabe que é mesmo capaz de eu experimentar? Um beijo grande e carinhoso.

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