Balé é coisa de menino?!

Nasce um menino e aí vem: tudo azul, futebol, basquete e…. balé! Opa, balé? Sim, balé. Nunca pensei em cores, livros, filmes, esportes ou qualquer outra atividade ou interesse designados para “meninos” ou para “meninas”. Fui criada com um irmão e uma irmã mais novos, e sempre fizemos de tudo sem qualquer designação específica por conta do gênero.

E aí vem o meu Noah, aos 5 anos, querendo “ir para aquela aula de dançar” porque as melhores amigas dele dançam balé toda sexta, “mommy, e eu não quero perder o playdate”. Sem hesitar falei: “sim, meu amor, sexta-feira você estará na “aula de dançar”.

Conversei com meu marido e, em nenhum momento, ouvi ou vi alguma expressão de desaprovação. Mas mesmo vivendo em Los Angeles, uma cidade eclética e multi-cultural, me deparei com situações interessantes. Vivo numa comunidade onde cada vez mais casais do mesmo sexo têm filhos. Na escola do Noah, vejo vários parceiros e parceiras deixarem suas crianças na porta da escola com um amor infinito e cuidado pela cria, e ainda assim tive que batalhar contra o clichê: “balé é coisa de gay”. Vi vários olhos, de gente viajada e culturamente misturada, revirando.

Nunca passou pela minha cabeça que determinados esportes ou profissões são para hetero ou homossexuais. Mas achei por bem preparar o meu filho para a batalha contra o “isso não é coisa de menino”. E foi assim: computador, sites de vídeos e a busca frenética pelo melhor de Nureyev, Baryshnikov, Michael Jackson e os dançarinos mais contemporâneos. E o ponto foi esse: precisa de muito músculo e força pra correr, pular, rodopiar e levantar todas essas bailarinas. Um cérebro aguçado para memorizar todas as coreografias. E um coração maior que o mundo para apreciar a poesia das músicas, das histórias e da dança.

E lá vai ele, todo orgulhoso, para as suas aulinhas, de short, camisa de time de futebol e meião. Presente em todas as posições e com os ouvidos atentos ao ritmo delicado da música clássica. Aprendendo francês e escolhendo quem faz o melhor “pax-de-deux” numa fila de 10 menininhas, com tutus uns maiores do que os outros, com os olhinhos brilhando para serem rodopiadas pelo Noah.

No fundo, no fundo, o meu Noah quer é um bom hip-hop, rodopiar de ponta-cabeça no chão e saltos mirabolantes. Mas ele sabe – depois de conversamos com alguns dos melhores coreógrafos aqui em LA – que, para rodopiar e pular, ele precisa da base, da história.

E assim vamos, das aulas de balé para o karatê, basquete, futebol, pintura e culinária. Da força do tigre para a leveza dos pássaros, pela paixão de criar um ser humano que aprecie o que é belo, viva o que é belo, e seja forte nas suas escolhas.

No mundo de hoje, onde a velocidade da informação é quase mais rápida do que a da luz, eu e o Mark criamos os nossos meninos oferecendo todas as opções que a vida pode proporcionar. Do balé à cozinha, passando pela construção de caminhões mirabolantes e foguetes. E se no final ele quiser ser médico, advogado, arquiteto, astronauta ou presidente, que vá dançando ao som das mais belas peças musicais e confiante das certezas do seu coraçãozinho.

 

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10 Comentários

  1. Camila
    29 de Janeiro de 2013 at 8:39 — Responder

    Patricia, que lindo texto. Fiquei emocionada. Fico feliz que Noah e Rio tenham as melhores oportunidades e que consigam viver inocentemente todas as experiencias sem o confronto do preconceito. Que eles sigam assim, querida, sob seu olhar atento e de Mark. Um beijo Camila

  2. Nivia
    29 de Janeiro de 2013 at 14:51 — Responder

    Patrícia, fiz ballet a vida inteira. Tive que parar para poder me dedicar ao jornalismo, mas meu coração nunca deixou de ser dele.
    Seu texto me emocionou muito. Obrigada por ter escrito.

  3. Mariana
    29 de Janeiro de 2013 at 20:56 — Responder

    Patricia, fiquei muito emocionada com o seu texto… Que família linda. Um beijo carinhoso.

  4. Meiree
    29 de Janeiro de 2013 at 21:03 — Responder

    Que texto! Que liberdade! Quanta responsabilidade a nossa, né? Deixar a criança crescer e aprender sem as nossas influências, nossas travas… Parabéns!

  5. Fabiana Figueiredo
    4 de Fevereiro de 2013 at 18:02 — Responder

    Que texto emocionante!! A delicadeza da arte não passa por questões de gênero e o mundo é muito mais feliz com liberdade! Parabéns Patricia

  6. Anna
    4 de Maio de 2014 at 16:24 — Responder

    Patricia muito lindo!!!
    Meu filho tem dois anos e so fala em ballet, não sei se por causa algum desenho, de coleguinhas da escola ou por causa de uma prima minha que faz ballet e nós ja fomos em algumas apresentações dela.
    Moro em uma cidade pequena no interior de minas gerais onde o preconceito e imenso. O q vc acha q u devo fazer, será q ainda e muito novo?

    • Saulo Brício
      20 de Maio de 2014 at 16:05 — Responder

      Passo pelo mesmo dilema da Anna. Meu filho tem a mesma idade. Única exceção é que não tenho ninguém na família que possa estar influenciando.
      Me sinto mal em não achar legal. Tô começando a pesquisar para fugir do preconceito.

      • Camila
        21 de Maio de 2014 at 23:52 — Responder

        Oi Saulo, informação é o primeiro passo pra se livrar do preconceito. Espero que esse post tenha sido util pra voce. Abs.

  7. Fabio
    1 de Abril de 2015 at 17:38 — Responder

    Nossa! Confesso que tive que usar uma das mãos para não deixar a lágrima cair… Meu filho Arthur tem 4 anos e esses dias me viu trabalhando no computar e falou: “Pai eu queria fazer balé..”

    Eu parei tudo que estava fazendo e acessei o youtube com ele no meu colo e ficamos 1 hora assistindo casais dançando balé…

    Nunca fiz balé… Fiz, por 4 anos teatro, Tive Banda de Rock, Judô, Capoeira… Mas o meu filho escolheu balé, não vejo nenhuma diferença, entre a escolha dela e as minhas, é apenas uma atvidade diferente das que eu escolhi…

    Hoje estou a procura de uma escola, mas acreditem, já encontrei algumas que não aceitam meninos… Vai entender…

    Patricia, o seu texto é como um bom vinho, feito para ser apreciado com delicadeza.

    Parabéns

  8. Nathalia
    4 de Fevereiro de 2019 at 17:54 — Responder

    O engraçado é que: menino pode dançar balé, mas desde que seja para provar que isso não irá fazer dele um adulto gay. Ou seja, o preconceito é muito mais embaixo.

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