Há um tempinho atrás eu li esse post da minha amiga Flávia, que recentemente entrou de cabeça nesse mundão que é a maternidade, e a reflexão dela é a mesma de todas nós: a solidão que a gente sente nos primeiros meses, quando o bebê é recém-nascido. Apresentei o post no nosso grupo do Facebook e constatei que subiu um arrepio coletivo na nuca de todas as mães, e fomos solidárias com a Flávia, que estava precisando de um abraço coletivo, mesmo que virtual.
Quando se é mãe de primeira viagem, é tudo novidade. E depois que a gente volta pra casa é hora de encarar sem test-drive uma situação completamente nova e para a qual você não estava preparada. Por mais livros que a gente leia, por mais amigas-mães que a gente conviva, no final das contas, nunca estamos preparadas para a sensação de solidão e desamparo.
Refletindo agora, depois de alguns anos, acho que essa solidão foi uma mistura de coisas. A primeira delas foi a mudança em mim. Passei de workaholic, cheia de atividades, para ser mãe e eu me sentia presa nesse papel. Presa dentro de casa com aquela coisica mais linda do universo, mas que só fazia chorar, mamar, dormir (de dia, né?) e sujar fraldas. E acho que também foi uma mudança na configuração geral da vida. Como eu me relacionava com as pessoas, com a vida, com o trabalho, com o mundo, de repente eu passei a ser uma pessoa menos disponível. Pra todo mundo e também pra mim.
Mas a verdade é que nada disso foi realmente sério enquanto a Vicky era recém-nascida. O problema da nossa solidão logo que eles nascem é esse ajuste automático que temos que fazer na gente. Essa reprogramação de vida não é gradual. De repente você está na maternidade falando com a gráfica pra eles rodarem um livro com o papel Pólen ao invés de couché e dois dias depois você nunca mais dorme e nem quer saber como ficou o livro que a gráfica estava rodando.
Mas sabe o que eu fiz pra minimizar essa sensação de solidão? Convidei gente para vir na minha casa. De cara eu preferi que as pessoas fossem me visitar em casa, ao invés de maternidade. Eu comprei uma pequena seleção de roupas fofas de ficar em casa e que fossem também práticas pra amamentar (Vicky mamava em livre demanda), deixava a mesa sempre pronta e estoquei a casa com lanchinhos. A padaria da esquina também entregava. E com isso era um desfile de amigos, todos os dias, que me traziam notícias do mundo e aproveitavam pra fazer a Victoria de boneca. Todo mundo queria ninar, trocar fralda, dar banho, pegar no colo. E minha pequena boneca – que sempre foi sociável, adorava aquele monte de atenção (como boa leonina) que era dispensada só pra ela. Enquanto isso a mamãe aqui ficava deitada no sofá, ou sentada na poltrona com os pés pra cima. Bebendo litros de água e lutando pra comer saudavelmente.
Já as madrugadas…. Bom as madrugadas eram minhas. Fabiano acordava cedo pra trabalhar. Na época ele trabalhava remotamente pra uma empresa americana, então ele teve três dias de descanso. Como eu tinha a possibilidade de dormir quando ela dormisse, eu encarava as madrugadas sozinha. Confesso que não foi tão ruim assim. Eu sempre fui de varar madrugadas, então enquanto ela mamava eu tava vendo seriado na TV, encarava lanchinhos fortuitos, coisas assim. Ruim era quando eu não dormia durante o dia com ela (quem consegue, de fato, dormir toda vez que o bebê dorme?) e ela passava a madrugada chorando só porque entrou nessa vibe. Aí eu inventei formas diversas e bizarras de niná-la, inventei música, inventei histórias. Foram madrugadas insones, solitárias, mas criativas, pelo menos. Lembro ainda que pro Fabiano eram madrugadas difíceis. Ele estava dormindo, mas meio acordado, ouvindo a movimentação da sala, da TV, da geladeira, do bebê chorando. Acordava pra me encontrar dormindo sentada com uma Victoria também dormindo, mas ainda agarrada ao peito e levava todo mundo pra cama. Ele também ficou bem cansado.
A verdade é que a gente se acostuma com tudo, até com essas rotinas malucas. O ruim é que as rotinas malucas vão mudando a cada fase e o nosso organismo e nossa cabeça que precisam correr pra não ficar pra trás. É solitário mesmo gente. Mas é tão rápido e, de repente, tudo se encaixa e fica tão bom. Basta você ter jogo de cintura. E evitar que a solidão se instale com uma dose extra de bom humor e bons amigos.
Imagem: Micah Sittig
11 Comentários
Vc tem o dom da palavra!!!! Colocou em palavras sentimentos tão confusos! Dps do post de hj tô até me entendendo um pouco mais. Obrigada como sempre!!
Lu, você é uma fofa. Obrigada e um beijão!
Adoreii e continue assim essa maezona que vc é!!!
Amanda, obrigada pelo carinho. 🙂
Parabéns, Camila! Tenho passado por isso desde janeiro e depois de 10 anos do primeiro filho! Tem um pequeno dormindo no peito agora e graças a essa invenção chamada celular, me sinto menos sozinha durante as madrugadas de colo! Não nego o quanto é bom, pois passa mesmo muito rápido! 🙂
Olá, minha segunda filha nasceu com Síndrome de Down e hoje ela é meu amor excepcional, porém quando temos um filho diferente enfrentamos esta solidão mulyiplicada. segue um texto que me ajudou no começo, texto este que reli por muito tempo, um beijo.
Bem-vindo à Holanda
Freqüentemente sou solicitada a descrever a experiência de criar um filho portador de deficiência, para tentar ajudar as pessoas que nunca compartilharam dessa experiência única a entender, a imaginar como deve ser. É mais ou menos assim…
Quando você vai ter um bebê, é como planejar uma fabulosa viagem de férias – para a Itália. Você compra uma penca de guias de viagem e faz planos maravilhosos. O Coliseu. Davi, de Michelangelo. As gôndolas de Veneza. Você pode aprender algumas frases convenientes em italiano. É tudo muito empolgante.
Após meses de ansiosa expectativa, finalmente chega o dia. Você arruma suas malas e vai embora. Várias horas depois, o avião aterrissa. A comissária de bordo chega e diz: “Bem-vindos à Holanda”.
“Holanda?!? Você diz, “Como assim, Holanda? Eu escolhi a Itália. Toda a minha vida eu tenho sonhado em ir para a Itália.”
Mas houve uma mudança no plano de vôo. Eles aterrissaram na Holanda e é lá que você deve ficar.
O mais importante é que eles não te levaram para um lugar horrível, repulsivo, imundo, cheio de pestilências, inanição e doenças. É apenas um lugar diferente.
Então você deve sair e comprar novos guias de viagem. E você deve aprender todo um novo idioma. E você vai conhecer todo um novo grupo de pessoas que você nunca teria conhecido.
É apenas um lugar diferente. Tem um ritmo mais lento do que a Itália, é menos vistoso que a itália. Mas depois de você estar lá por um tempo e respirar fundo, você olha ao redor e começa a perceber que a Holanda tem moinhos de vento, a Holanda tem tulipas, a Holanda tem até Rembrandts.
Mas todo mundo que você conhece está ocupado indo e voltando da Itália, e todos se gabam de quão maravilhosos foram os momentos que eles tiveram lá. E toda sua vida você vai dizer “Sim, era para onde eu deveria ter ido. É o que eu tinha planejado.”
E a dor que isso causa não irá embora nunca, jamais, porque a perda desse sonho é uma perda extremamente significativa.
No entanto, se você passar sua vida de luto pelo fato de não ter chegado à Itália, você nunca estará livre para aproveitar as coisas muito especiais e absolutamente fascinantes da Holanda.
Lindo texto Suzy! Obrigada! Beijo
Olá Camila.
Realmente sensacional o seu post… ADOREI!!! Me identifiquei demais com ele, principalmente pelo fato de vc ter usado essa palavra “solidão”…
Primeiro porque esse “pequeno grande” detalhe não vem descrito em nem um livro, em nenhum daqueles inúmeros manuais de “Como Ser Mãe”, você só vai descobrir isso vivenciando o momento; e segundo pq parece que paira no ar uma política de não se poder falar nada de desagradável ou reclamar dessa fase que é pra ser tão maravilhosa… Parece que não podia desabafar isso com ninguém que já viriam, mesmo que silenciosamente, me criticar.
Hoje meu bebê está com 4meses e meio, mas relendo coisas que escrevi há exatos 3 meses, eu me sentia um E.T….
Escrevi (escrevo para mim mesma… Rsrs) exatamente sobre isso: como podia me sentir tão sozinha (principalmente nas madrugadas), no momento mais importante e sonhado da minha vida, e pior, ninguém falar sobre isso?!!!
Que bom que achei o seu post Camila… Hoje, como vc mesma falou, tudo muda e esse sentimento já passou… Mas saber que realmente não sou diferente e saber que muitas outras tem ou tiveram a mesma sensação que eu, diminui a minha culpa de ter me achado egoísta nesse momento tão MÁGICO!!!
Muito obrigada por compartilhar isso conosco, de ter coragem de falar o que ninguém quer falar… Pq quando vc está do outro lado, vc acha que tudo é um mar de rosas, e não é bem assim não… É muito amor e muita paixão, acima de tudo!!!
Ainda em tempo, queria parabenizar esse lindo texto que a Suzy postou. LINDÍSSIMO!!! ADOREI!!
Um beijo,
Renata.
Tb já refleti muito sobre a solidão… é quase um rito de passagem da maternidade pelo qual todas passam. E é absolutamente pessoal e intransferível… ai que duro, mas passa.
http://www.maratonamotherna.blogspot.com.br/2014/05/a-solidao.html
Maravilhoso texto!!! Eu Fiquei um pouco traumatizada com essa primeira fase, tive aquela melancolia pós parto bem pesada, e ao contrário de vc, eu me escondi do mundo!!! Não queria q ninguém pegasse, visse ou fotografasse minha bebê. Meu marido mesmo tendo oportunidade, escolheu não tirar férias. Passava os dias e noites chorando agarrada com ela, amamentando e sofrendo por tudo que ela ainda vai passar nessa vida!!! Foi bem difícil, mas melhorou!! Ainda me sinto bem perdida e sozinha por não ter amigas mães e nem minha própria mãe presente!! Ainda bem que tem a blogosfera materna p nos amparar!!!!
Uau! Super me identifiquei! É E-X-A-T-A-M-E-N-TE isso!
Minha filha completa hoje, 32 dias de vida e estou vivendo e sentindo tudo que relatou!