Lembro bem da primeira reunião de trabalho que tive no primeiro dia útil do ano de 2010 . Aliás, mentira, não lembro de nada, porque eu simplesmente apaguei encostada no braço do sofá e a única coisa que ouvi ao longe foi a voz do meu pai (e chefe) dizendo: “deixa ela dormir, deixa ela dormir”. Apesar de estar basicamente em família, ainda assim foi um vexame sem tamanho.
E se você acha que o sono é a única coisa que atrapalhou a minha vida naquele ano você está enganada. Além da vontade de hibernar em pleno verão carioca, teve mais uma pequena série de desconfortos físicos. Mas nada poderia ter me preparado para o que minou muito da minha resistência, sobretudo no trabalho. A perda de memória e a falta de concentração, ou o que eu carinhosamente chamo de burrice gestacional.
Imagina uma editora, que trabalha com vários projetos ao mesmo tempo e milhões de pequenos detalhes diariamente, esquecer metade dos afazeres do dia? Foi um furo atrás do outro, um inferno astral que durou muitos meses, porque eu simplesmente não conseguia lembrar das coisas e estava mais distraída e procrastinadora do que nunca. Acho que foi um prenúncio de que eu jamais voltaria a ser a mesma pessoa novamente.
Mas o que é isso?
Nada demais. São os hormônios da gravidez brincando com o seu corpo (e o aumento da progesterona). E, acredite se quiser, o volume de células do seu cérebro diminui no último trimestre. Mas não se assuste: a condição é totalmente temporária e volta ao normal algumas semanas após o parto.
Dá para evitar?
Não muito, mas evite se cansar demasiadamente, pois o cansaço tornará você mais lenta. Coma direito e beba bastante água para manter o corpo são (consequentemente a mente sã) e, caso seu médico autorize, procure fazer exercícios regularmente, pois o sangue vai circular melhor por todo o seu corpo (incluindo o seu cérebro).
E o que fazer para não sofrer tanto?
- Em primeiro lugar não sofra tanto! Parece difícil, mas se estressar com isso só vai piorar a situação.
- Antes de dormir (ou logo que acordar), faça uma lista detalhada de tudo o que você precisa fazer no dia. E faça deste diário seu melhor amigo.
- Use o alarme do seu celular ou tablete para te lembrar de tudo: de tomar remédios até sair para consulta com o obstetra.
- Diminua um pouco o tamanho da sua responsabilidade e aprenda a delegar o que for possível. Aliás, essa é lição para carregar para sempre a partir de HOJE.
- Mantenha o bom-humor e faça um estoque de pequenos mimos para quem for afetado pela sua burrice gestacional. Perdeu o horário na manicure? Leve um mimo na próxima consulta. Esqueceu de mandar um e-mail importante? Dê um telefonema carinhoso e bem-humorado. Aos trancos e barrancos, você conseguirá manter a sua dignidade intacta e não vai perder amigos e contatos profissionais.
- Nem pense em tomar remédio para memória. Aliás, você já sabe que não pode comer nem bala sem perguntar pro seu médico antes, certo?
E, apesar da burrice gestacional ter me abandonado depois que a Vicky nasceu, algumas coisas na minha mente mudaram para sempre. Foi muito difícil aceitar que eu não seria aquele trator que estava passando pela vida abraçando o mundo com os braços e as pernas. Você passa a ter menos tempo, você passa a focar em algo mais importante. E você deve sofrer menos do que eu sofri, só porque eu estou explicando isso pra você, tá? Se dê um desconto.
Imagem: Simon Powell
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