Há alguns anos atrás eu verbalizei em alto e bom tom que me achava uma mãe negligente. Sim, eu mesma. A mãe que escreve quase que diariamente em um site de maternidade, a mãe que incluiu maternidade na linha editorial de sua editora, porque o assunto a fascinava, a mesma mãe que foi em programa de televisão se gabar que sua filha de três anos sabia lavar calcinha no banho e aprendeu a lavar louça na frente de milhares de pessoas, diante de um câmera embasbacado. Eu mesma.
Aí que, né? Terapia tá aí pra isso. Pra você se livrar dessas neuroses ridículas que teimam em te importunar. E eu fui na raiz do problema pra entender porque eu, que sempre fui muito relaxada com rótulos, passei a me sentir dessa maneira.
E penso que eu achei o que estava me incomodando. Será que estamos tentando demais?
Nesses últimos seis anos eu tive todo tipo de pensamento obsessivo, mesmo que por segundos. Será que eu deveria ter engravidado mais jovem? Será que eu deveria ter engravidado mais magra? Será que eu deveria ter me sentido violentada porque não lutei o suficiente por um parto normal? Será que eu não sou apegada a minha filha porque não usei sling, não amamentei até os três anos e não era particularmente feliz porque ela não gostava de dormir no quarto dela? Será que eu deveria questionar mais o calendário de vacinação? Será que eu deveria lutar mais para que a realidade brasileira permitisse educação em casa ao invés de educação compulsória em uma escola? Será que eu deveria pegar leve na minha carreira pra ficar mais em casa com ela?
Como eu disse. Eu faço análise. Muita análise.
Os anos estão passando, hoje ela está com quase seis anos e alguns assuntos como o tipo de parto, os anos que eu amamentei, a cama compartilhada, o desfralde prolongado, as problematizações com chupeta, mamadeira, vacinas, fralda descartável, tudo isso passou. E embora eu racionalize e questione bastante um monte de coisas, eu nunca fui uma mãe particularmente neurótica. E ainda assim eu olho pra trás e me pergunto se não estamos fazendo um auê de proporções nababescas com assuntos que são importantes só por um curto período de tempo. Em um piscar de olhos tudo muda. Nós mudamos. Eles mais ainda.
Nunca fui a mãe perfeita
Eu sempre me achei um pouco negligente, talvez por que eu nunca tenha tido a disciplina necessária para ser a epítome da mãe perfeita. Eu ainda luto com essa questão: a de me achar uma mãe pior do que eu realmente sou.
Acho que no fundo eu sou uma mãe “responsiva”: aquela que reage na medida da necessidade da minha filha. O que é o oposto na mãe superprotetora ou helicóptero, que controla tudo, toma a frente da situação, deixa o filho morar em uma bolha e antecipa todas as necessidades da criança e como ele deve reagir. E, minha forma toda particular de criar a Vicky é quem também está moldando minha filha para ser quem ela escolher ser quando crescer.
Existe uma razão pela qual ela é assertiva, geniosa, irônica, independente e cheia de opiniões. É minha influência direta. E essa dose generosa de “girl power” que ela recebe junto com o leite da manhã é o que torna ela tão interessante. E isso é trabalho direto, 100% meu.
É assustador ser a pessoa responsável por criar uma pessoa dentro de si e parir uma vida. É ainda mais assustador ter a capacidade de moldar a cabeça de um ser vivo, guia-lo para que ele seja um ser humano que vai contribuir para a vida em sociedade.
Estamos tentando demais?
Olhando por esse prisma, talvez você possa ser um pouco neurótica, talvez você possa problematizar um pouco questões aparentemente idiotas. Mas enquanto lemos centenas de livros, ouvimos dezenas de educadores, psicólogos, pedagogos, mães formadoras de opinião, a grande mídia, tudo o que nos cerca, eu ainda olho pra trás e me pergunto se não estamos tentando demais; se tudo não deveria ser mais instintivo, mais simples.
Parece que se você não se encaixa no atual padrão materno, você não presta como mãe. E aí fica insegura. E aí precisa de uma ajuda externa, precisa de consultoria, de um coach, de terapia intensiva. Você prefere ouvir mães que nunca viu ao vivo a confiar no seu próprio instinto. Você precisa virar uma “Stepford wife”, precisa virar a versão materna de “Bela, recatada e do lar”.
NÃO!!!!!!
Estamos sim tentando demais. Por isso ouça a sua voz interior, confie no seu taco, não siga métodos à risca. Continue trocando, continue nos lendo, continue opinando, mas embaralhe todas as cartas e siga o seu coração. Quantas vezes eu já te falei que você é a melhor mãe que seu filhote poderia ter? Sobretudo se você está grávida ou com um bebezinho, não entre na neura de 9 entre 10 mães dessa galáxia e não seja tão obsessiva. Não dá pra controlar tudo e tentar ser a mãe perfeita é uma dor de cabeça tão grande que não vale nem a pena tentar.
De mais a mais, o que você prefere: o rótulo de “bela, recatada e do lar” ou “linda, livre e louca”?
Ufa. Estou me sentindo mais leve. E você?
4 Comentários
Adorei Camila!
<3
Fico feliz por estares mais leve, Camila (adoro teus textos, de verdade!). Mas ainda estou na dúvida se prefiro “bela, recatada e do lar” ou “linda, livre e louca”.
Bela, recatada e do lar aqui JAMAIS. Hahahahah 🙂